Diário de Bordo
Relatos do que aconteceu a cada dia, por quem está lá AQUI.
Como vamos?
Vamos andar todos juntos. Vamos percorrer trilhos e estradas.
Vamos por vezes acampar e por vezes dormir em ginásios ou em outros espaços que nos acolham.
Vamos desafiarmo-nos. Vamos apoiar-nos mutuamente, respeitarmo-nos e cuidar uns dos outros.
Vamos ouvir, cirandar e assemblear com as comunidades.
Vamos conviver, formar-nos e aprender umas com as outras.
Logística
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Programa
Podes ver o programa completo aqui.
Política de Espaço Seguro
Podes ler aqui os acordos entre todas sobre como vamos comunicar e comportarmo-nos umas com as outras de forma a criarmos um espaço de respeito mutuo, colaboração e de cuidado umas com as outras.
Porquê marchar a pé tantos quilómetros?
Marchar 400km (maioritariamente) a pé é um enorme esforço pessoal, político, emocional e logístico. Todas nós temos as nossas vidas pessoais e profissionais, e interromper a normalidade para marchar durante duas semanas pode parecer de loucos. O pior é que de loucos mesmo é a absurda realidade da crise climática. Se achas que a tua vida não foi ainda interrompida pelos efeitos da crise climática, sê-lo-á em breve. Em Portugal, se não agirmos para mudar o sistema em breve, o ciclo infernal da desertificação, da seca e dos incêndios vai continuar a agravar-se. Esse é um problema meu, é um problema teu, é um problema de todas as pessoas.
Marchar tantos quilómetros a pé procura um movimento pela justiça climático mais consolidado e com mais compromisso, disposto a lutar ferozmente pela justiça climática. Inspiramo-nos em exemplos históricos de grandes e longas marchas a pé que, com a sua incrível coragem, ganharam lutas que mudaram o rumo da Humanidade. Estamos a falar de momentos tão icónicos como a Marcha do Sal de Gandhi, ou da Marcha de Selma a Montgomery levada a cabo pelo Movimento dos Direitos Civis nos Estados Unidos.
Onde vamos?
Vamos percorrer 400km, de Leirosa a Lisboa a pé e de transportes públicos.
O caminho é dividido em pequenos trechos sendo que podes participar em todo o caminho ou numa parte.
Porquê este percurso?
A crise climática é o tempo das nossas vidas e já está a provocar vários efeitos nefastos no território português. A expressão mais forte e evidente da crise climática em Portugal é a desertificação.
A Caravana toma, assim, 2 temas principais ao longo do caminho:
- O fogo (associado aos incêndios, aos eucaliptos, às empresas de celuloses, ao abandono que é a base para a degradação das florestas) saindo na Navigator e da Celbi da Figueira da Foz até a Vila Velha de Ródão e à Celtejo;
- e a água (seca, degradação do rio, poluição por parte das grandes infraestruturas, criação de inúmeras barragens e açudes que cortam o rio e o degradam) à medida que descemos o Tejo até Lisboa.
O percurso abarca, por um lado, a passagem pelas comunidades mais afetadas pelos efeitos flagrantes da crise climática em Portugal como os monstruosos incêndios florestais e a desertificação no interior-centro do território. Por outro lado, durante a Caravana passaremos, assinalando e denunciando as infraestruturas que têm mais responsabilidade sob a crise climática e seus efeitos no país. Referimo-nos a massivas infraestruturas de empresas como a Navigator e Altri (indústria da celulose), a Cimpor (indústria do cimento), Trustenergy (central a gás fóssil) e a EDP (central a gás e barragens) que, para além de terem uma enorme influência negativa na má gestão e proteção da água e da floresta, são grandes emissoras de CO2.
Porquê estas empresas?
Estas empresas, orientadas pelo sistema capitalista para colocar o lucro acima da vida das pessoas e do planeta, acarretam uma grande responsabilidade sobre as emissões de CO2 e a degradação ecológica em Portugal. Desde a perspetiva da justiça climática, esta degradação ecológica está intimamente ligada com injustiças sociais.
Comecemos pela Navigator e pela Altri. Senhoras do monopólio da celulose, detêm uma enorme influência na gestão de todo o mundo rural, que ao longo dos anos se tem vindo a tornar um autêntico eucaliptal para servir os interesses da produção e exportação em massa da indústria do papel. Portugal tem a maior área relativa de eucaliptos do mundo, sendo 1/3 da nossa floresta coberta por esta espécie, sendo o nosso o país do Mediterrâneo que mais arde. A Navigator é, além disto, a empresa nº1 em Portugal em termos de emissões de gases com efeito de estufa. Ainda assim pintam-se de verde a apresentam-se como uma empresa “verde”. Nada poderia estar mais distante da realidade. Passaremos por três fábricas da Altri (Celbi, Celtejo e Caima) e por duas fábricas da Navigator (Figueira da Foz e Vila Velha de Ródão).
A CIMPOR é a 4ª empresa mais emissora em Portugal e detém a 6ª infraestrutura mais emissora do país, o centro de produção de Alhandra, onde passaremos no dia 16 de Abril. É dona de muitas cimenteiras, centrais de betão e pedreiras. No dia 4 de Abril, uma parte da caravana passará na central de Souselas deste empresa.
A TrustEnergy detém a Central de Ciclo Combinada do Pego, que continua a queimar gás fóssil rumo ao caos climático, por onde passaremos no dia 13 de Abril.
A EDP é dona da Central térmica de Lares, por onde vamos passar no dia 3 de Abril. Esta é a 4ª infraestrutura mais emissora do país. É uma infraestrutura massiva que produz energia através da queima do gás fóssil, bloqueando ativamente uma transição para uma sociedade gerida com 100% de energias renováveis. Para além desta Central, a EDP está historicamente associada às grandes barragens que se construíram neste país e às grandes centrais de carvão que entretanto fecharam.
É certo que existem algumas outras empresas grandes responsáveis pelas emissões e pelo agravamento da crise climática em Portugal, mas estas são aquelas que nos permitem focar no fogo e na água.
Acresce que passaremos em locais onde se pretendem erigir projetos desastrosos, como o Projeto Tejo, onde várias empresas ligadas ao agronegócio querem construir um novo complexo de barragens para criar um “Alqueva do Tejo”, que vai destruir alguns dos últimos troços ainda livres do rio Tejo para irrigar agricultura intensiva para exportação (incluindo, muito provavelmente e para cúmulo do absurdo, a rega de eucaliptos). Perante uma redução da disponibilidade de água, o que estas empresas propõe é acabar de vez com o rio, promover o uso irracional da água e arruinar os ecossistemas e património cultural do Tejo.
Porque é que vamos?
A Caravana pela Justiça Climática pretende assinalar os impactos atuais das alterações climáticas em Portugal, assinalar os responsáveis e construir pontes com e entre comunidades afetadas.
Vamos atravessar as localidades mais afetadas pelos incêndios e seca, criando espaços de diálogo e cooperação com as comunidades da linha da frente da desertificação, para construirmos pontes e plantar sementes que durem para além destas 2 semanas.
Vamos igualmente assinalar as práticas e as indústrias que aceleram a crise climática tal como a irresponsabilidade, a impunidade, a manipulação e a ganância do sistema capitalista que coloca lucro acima da vida.
A caravana pela Justiça climática é um momento e espaço para a transformação social e histórica necessária para mudar o rumo da sociedade.
Ainda estás na dúvida se deves participar na Caravana?
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A Caravana é um processo colectivo entre mais de 30 organizações. Descobre o Manifesto que nos une AQUI.
MANIFESTO
Porque dizem que não vão exigir nada ao governo? Não é o poder institucional que tem competências para mudar?
A Caravana pela Justiça Climática surge inspirada por uma convocatória internacional lançada pelo Acordo de Glasgow. A premissa política base é que, décadas depois, as instituições falharam-nos em resolver a crise climática. Inúmeras COPs e acordos internacionais depois, a verdade é que as emissões continuam a aumentar e os desastres climáticos não páram, agravando as já existentes desigualdades e injustiças deste sistema. Se o movimento pela justiça climática quer ganhar, então precisa de parar de rogar às instituições que façam algo. Em vez disso, é necessário arregaçar as mangas e construir a sua própria linha da frente popular. É com um enorme e massivo movimento que vamos fechar as principais infraestruturas emissoras. É com este mesmo movimento, onde as comunidades e os trabalhadores estão envolvidos, que vamos construir e executar os planos para uma transição justa rumo às energias renováveis, à justiça social, ao emprego digno, ao ambiente saudável e aos cuidados para com as pessoas.
Esta marcha quer ajudar a construir este movimento. O movimento tem vindo avançar, mas precisa de se aproximar das comunidades na linha da frente da crise climática e da transição justa, rompendo também uma barreira histórica de separação entre o urbano e o rural.
A ideia é gira, mas que mudança vai produzir?
E se, de repente, centenas de pessoas interrompessem a normalidade da sua vida para marchar 400km, revoltadas com o sistema que coloca sempre o lucro em cima da vida? Frustradas com a falta de resposta aos incêndios e à seca? Zangadas com a impunidade das grandes indústrias que tudo podem poluir? Furiosas com as promessas em vão do fim da era dos combustíveis fósseis? Desgastadas de ver as injustiças sociais produzidas pelo sistema capitalista que não leva a sério a necessidade de uma transição justa, estruturada e planificada?
De repente, muito mudaria. De um momento para o outro, a normalidade – já ameaçada por eventos como a pandemia ou a guerra – romperia de vez. As pessoas já não tolerariam a ideia de um futuro em risco deixado nas mãos da inércia, nem tampouco a impunidade do sistema que as coloca abaixo do lucro.
Precisamos de uma grande mudança. E é a partir daqui que, com as pessoas connosco, queremos expandir as bases sociais para ganhar verdadeira justiça climática.
Porque é que a Caravana fala sobre justiça social?
Justiça climática é justiça social. A degradação ambiental acarreta consigo degradação social e injustiças. Quando uma série de territórios sofre fogos infernais mas nem o regime de propriedade nem o tipo de espécies são alterados, continuando a reinar o monopólio do eucalipto para alimentar as indústrias da celulose, está a acontecer uma injustiça social. Quando as condições inclusivamente pioram para esses territórios e essas comunidades, abandonadas como se nem pertencessem à sociedade do país, essa é a manifestação da injustiça social que existe sempre que não existe justiça climática. Quando são as pessoas que pagam caro, muitas vezes com a vida, crises que não criaram e emissões que não emitiram – com secas e fogos – estamos perante uma injustiça social massiva.
A crise climática é o momento de mudarmos tudo. Todas as centrais a gás pelas quais vamos passar têm de ser reconvertidas para produzirem energia renovável, garantindo ao mesmo tempo formação e emprego para os trabalhadores. A ganância de lucro da indústria da celulose tem de ser desmantelada, e o nosso território reflorestado com outras espécies de forma a criar resiliência, a construir comunidade e paisagem mais ricas, povoadas e mais seguras. Os rios têm de ser limpos, têm de ser protegidos, as espécies e ecossistemas mantidos e a água tem de gerida como o bem público que é, e não só como um factor de produção numa qualquer fileira industrial. Isto é justiça climática.